A cor do voto: única
negra, Marina atinge índices equivalentes independentemente da cor do eleitor;
pretos e pardos preferem Dilma; brancos, Aécio.
Marina Silva
(PSB) foi a única dos 11 candidatos a presidente que se declarou como negra ao
registrar sua candidatura. Não foi o suficiente para realçar ou abrir o tema
racial na campanha eleitoral. De acordo com a mais recente pesquisa do Ibope,
entre os que se declaram pretos e pardos, Dilma Rousseff (PT) aparece com 41%,
cinco pontos acima da sua média total (36%). Marina tem 30%, mesmo índice que
alcança no levantamento nacional. Aécio Neves (PSDB) chega a 14%, quatro pontos
a menos do que seu índice médio (19%).
Se tomado o
eleitorado que se declara branco, Dilma tem 30%, seis pontos a menos; Marina,
29%, um ponto a menos; Aécio tem 25%, seis pontos a mais.
Os números
mostram que Marina praticamente não varia na opção do eleitorado,
independentemente de sua declaração de cor.
Já Dilma é mais
votada entre os pretos e pardos do que entre os brancos. Com Aécio, ocorre o
fenômeno contrário, sendo mais bem votado entre brancos do que entre os pretos
e pardos.
Dilma tem
políticas de seu governo, como aumento real do salário mínimo, bolsa família e
o ProUni, com foco na população de baixa renda. Como entre estes os pretos e
pardos são maioria, justifica-se assim sua força eleitoral no segmento.
Aécio Neves não
pareceu capaz até aqui de reverter a imagem, nos segmentos mais pobres, de que
o PSDB governa para a elite. O Plano Real, criado no governo Itamar Franco na
gestão de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda, teve impacto
poderoso nas camadas pobres, ao conter a inflação que corroía os salários de
quem não podia recorrer à proteção do mercado financeiro. FHC iniciou a
política de rede social ao adotar o Bolsa-Escola. Mas a crise cambial de 1999 e
a forte recessão dos anos 2000 corroeram os benefícios anteriores na memória
popular.
Marina Silva faz
campanha sem forçar o discurso de que pode ser a primeira presidente negra da
história do Brasil. Não parece interessada no que os especialistas chamam de
racialização da campanha. Mas pode estar no discurso de enfrentamento das
mazelas raciais a chave da disputa eleitoral. Pontos que Dilma mantenha ou
ganhe ali ou que Marina cresça podem ser fundamentais num eventual segundo
turno, que se anuncia apertado.
A
abordagem racial é vista com reparos por analistas de mídia e por parcela dos
acadêmicos. A argumentação seria de que as mazelas sociais podem ser debatidas
e enfrentadas a partir de corte de problemas estabelecidos a partir das
diversas faixas de renda e escolaridade. Mas o estrato de declaração de cor não
deve ser desprezado. As estatísticas mostram por quê.
Um
trabalhador negro no Brasil ganha, em média, pouco mais da metade (57,4%) do
rendimento recebido pelos trabalhadores de cor branca. Em termos numéricos,
estamos falando de uma média salarial de R$ 1.400 para os trabalhadores negros,
enquanto a média dos trabalhadores brancos ganham R$ 2.400. Embora essa
desigualdade tenha diminuído nos últimos dez anos, ela continua bastante alta.
Desde 2003 os salários pagos a indivíduos de cor preta ou parda aumentaram, em
média, 51,4%, enquanto o dos brancos aumentou uma média de 27,8%.
Na Síntese de
Indicadores Sociais do IBGE, 46% da população brasileira é branca, 8% são
pretos, 45% são pardos. Os números indicam que mais da metade da
população brasileira é composta por não brancos.
De cada dez
empregadas domésticas no país, oito ganham até um salário mínimo e seis são
negras.
A porcentagem de
homens negros com curso superior completo é menor do que era a de homens
brancos em 1960.
A renda per
capita dos brancos de 1980 é o dobro da dos negros hoje.
A taxa de
analfabetismo dos negros é maior do que era a dos brancos há 40 anos.
Os negros
apresentam esperança de vida semelhante à que os brancos tinham 15 anos atrás.
A taxa de
homicídio entre os negros é o dobro da entre os brancos.
Os pretos e os
pardos, após os indígenas, são aqueles com a maior taxa de mortalidade
infantil.
Pretos e pardos
têm uma esperança de vida ao nascer bem menor do que os brancos.
No ranking do
Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o Brasil tem um padrão mediano. A
média, entretanto, oculta uma realidade perversa de desigualdade entre negros e
brancos. Se cada um desses dois grupos formasse um país à parte, a distância
entre eles seria de mais de 50 posições. A população branca teria IDH do nível
da Croácia. A população negra teria IDH médio equivalente à posição de El
Salvador e pior do que o Paraguai.
Temas não faltam
para uma campanha que quisesse abordar o problema racial e abrir discussão
sobre que caminhos tomar para começar a solucioná-los.
Fonte: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/plinio-fraga/a-cor-do-voto-unica-negra-marina-atinge-indices-165200913.html
[18-09-14]
PLÍNIO
FRAGA
Plínio Fraga é jornalista e mestre em Comunicação e Cultura pela UFRJ.
Foi editor e repórter de Folha de S.Paulo, O Globo, Jornal do Brasil e revista
Piauí. Elabora biografia de Tancredo Neves, a ser publicada pela editora
Objetiva. Aos 45 anos, vive no Rio de Janeiro. A cobertura da campanha
eleitoral de 2014 será a décima quarta que participa desde 1989.
Comentários
Postar um comentário