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A cor do voto: única negra, Marina atinge índices equivalentes independentemente da cor do eleitor; pretos e pardos preferem Dilma; brancos, Aécio.

·                            Por Plínio Fraga |  17-09-14

Marina Silva (PSB) foi a única dos 11 candidatos a presidente que se declarou como negra ao registrar sua candidatura. Não foi o suficiente para realçar ou abrir o tema racial na campanha eleitoral. De acordo com a mais recente pesquisa do Ibope, entre os que se declaram pretos e pardos, Dilma Rousseff (PT) aparece com 41%, cinco pontos acima da sua média total (36%). Marina tem 30%, mesmo índice que alcança no levantamento nacional. Aécio Neves (PSDB) chega a 14%, quatro pontos a menos do que seu índice médio (19%).
Se tomado o eleitorado que se declara branco, Dilma tem 30%, seis pontos a menos; Marina, 29%, um ponto a menos; Aécio tem 25%, seis pontos a mais.
Os números mostram que Marina praticamente não varia na opção do eleitorado, independentemente de sua declaração de cor.
Já Dilma é mais votada entre os pretos e pardos do que entre os brancos. Com Aécio, ocorre o fenômeno contrário, sendo mais bem votado entre brancos do que entre os pretos e pardos.
Dilma tem políticas de seu governo, como aumento real do salário mínimo, bolsa família e o ProUni, com foco na população de baixa renda. Como entre estes os pretos e pardos são maioria, justifica-se assim sua força eleitoral  no segmento.
Aécio Neves não pareceu capaz até aqui de reverter a imagem, nos segmentos mais pobres, de que o PSDB governa para a elite. O Plano Real, criado no governo Itamar Franco na gestão de Fernando Henrique Cardoso no Ministério da Fazenda, teve impacto poderoso nas camadas pobres, ao conter a inflação que corroía os salários de quem não podia recorrer à proteção do mercado financeiro. FHC iniciou a política de rede social ao adotar o Bolsa-Escola. Mas a crise cambial de 1999 e a forte recessão dos anos 2000 corroeram os benefícios anteriores na memória popular.
Marina Silva faz campanha sem forçar o discurso de que pode ser a primeira presidente negra da história do Brasil. Não parece interessada no que os especialistas chamam de racialização da campanha. Mas pode estar no discurso de enfrentamento das mazelas raciais a chave da disputa eleitoral. Pontos que Dilma mantenha ou ganhe ali ou que Marina cresça podem ser fundamentais num eventual segundo turno, que se anuncia apertado.
 A abordagem racial é vista com reparos por analistas de mídia e por parcela dos acadêmicos. A argumentação seria de que as mazelas sociais podem ser debatidas e enfrentadas a partir de corte de problemas estabelecidos a partir das diversas faixas de renda e escolaridade. Mas o estrato de declaração de cor não deve ser desprezado. As estatísticas mostram por quê.
 Um trabalhador negro no Brasil ganha, em média, pouco mais da metade (57,4%) do rendimento recebido pelos trabalhadores de cor branca. Em termos numéricos, estamos falando de uma média salarial de R$ 1.400 para os trabalhadores negros, enquanto a média dos trabalhadores brancos ganham R$ 2.400. Embora essa desigualdade tenha diminuído nos últimos dez anos, ela continua bastante alta. Desde 2003 os salários pagos a indivíduos de cor preta ou parda aumentaram, em média, 51,4%, enquanto o dos brancos aumentou uma média de 27,8%.
Na Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, 46% da população brasileira é branca, 8% são pretos, 45% são pardos. Os  números indicam que mais da metade da população brasileira é composta por não brancos.
De cada dez empregadas domésticas no país, oito ganham até um salário mínimo e seis são negras.
A porcentagem de homens negros com curso superior completo é menor do que era a de homens brancos em 1960.
A renda per capita dos brancos de 1980 é o dobro da dos negros hoje.
A taxa de analfabetismo dos negros é maior do que era a dos brancos há 40 anos.
Os negros apresentam esperança de vida semelhante à que os brancos tinham 15 anos atrás.
A taxa de homicídio entre os negros é o dobro da entre os brancos.
Os pretos e os pardos, após os indígenas, são aqueles com a maior taxa de mortalidade infantil.
Pretos e pardos têm uma esperança de vida ao nascer bem menor do que os brancos.
No ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), o Brasil tem um padrão mediano. A média, entretanto, oculta uma realidade perversa de desigualdade entre negros e brancos. Se cada um desses dois grupos formasse um país à parte, a distância entre eles seria de mais de 50 posições. A população branca teria IDH do nível da Croácia. A população negra teria IDH médio equivalente à posição de El Salvador e pior do que o Paraguai.
Temas não faltam para uma campanha que quisesse abordar o problema racial e abrir discussão sobre que caminhos tomar para começar a solucioná-los.


PLÍNIO FRAGA


Plínio Fraga é jornalista e mestre em Comunicação e Cultura pela UFRJ. Foi editor e repórter de Folha de S.Paulo, O Globo, Jornal do Brasil e revista Piauí. Elabora biografia de Tancredo Neves, a ser publicada pela editora Objetiva. Aos 45 anos, vive no Rio de Janeiro. A cobertura da campanha eleitoral de 2014 será a décima quarta que participa desde 1989.


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