Camila Alonso Suarez-C5N
Manifestação levou milhares de pessoas em todo o país sob o lema de "Orgulho Antifascista e Antirracista" contra o chamado "projeto de igualdade perante a lei", uma cruzada do presidente Javier Milei contra questões de identidade de género e a diversidade sexual.
Márcio
Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires -
Joaquín
Caballero-CNN
O cenário
do Congresso se relaciona com o "projeto de igualdade perante a lei",
uma cruzada de Milei contra questões de identidade de género e contra a
diversidade sexual. O projeto prevê retirar do código penal argentino o
"feminicídio" como agravante penal, o documento de identidade
não-binário e a cota para pessoas transsexuais em dependências do Estado.
A Casa
Rosada aparece como o centro das ideias que têm ganho um conteúdo cada vez mais
radical à medida que Milei exibe estabilidade econômica e proximidade com
Donald Trump.
O
manifestante Sebastián Sierra, de 31 anos, apoia a causa LGBTQIA+ com a venda
de bonés com a inscrição "Make Argentina Gay Again" (Faça a Argentina
Gay Novamente) em oposição ao discurso MADA de Donald Trump, adaptado por
Javier Milei como Make Argentina Great Again.
"O
efeito prático deste protesto é frear a agenda anti-LGBTQIA+, anti-direitos
humanos e anti-woke de Milei. O boné, com a inscrição em inglês, visa dar uma
projeção internacional à causa, uma vez que levaram os ataques ao cenário
mundial durante o Foro de Davos", explica Sebastián à RFI.
"Esta
é uma causa contra todos os governos da extrema-direita, alinhados contra a
agenda de direitos humanos", acrescenta.
Javier
Milei tem adotado um discurso de perseguição ao feminismo e à diversidade
sexual, mas também contra a imigração e contra a defesa do meio-ambiente. No
que se refere à diversidade sexual, o discurso se contradiz com o seu mantra
liberal de "respeitar de forma irrestrita o projeto de vida do
próximo" sob a alegação de, na verdade, buscar a "igualdade perante a
lei".
"Não é
uma contradição. É simplesmente uma enganação. Milei fez as pessoas acreditarem
que é um liberal, essencialmente a favor dos direitos humanos e da liberdade.
Porém, isso é apenas no campo econômico. No fundo, é apenas um ultraconservador
de extrema-direita. Isso se revela agora", acusa Sebastián.
Convocada
por organizações sociais, centrais sindicais, movimentos de esquerda e,
principalmente, pela comunidade LGBTQIA+, a manifestação tenta combater o
discurso de ódio do presidente Javier Milei, que ganhou projeção mundial ao ser
ecoado através do Foro Econômico de Davos. Somaram-se à manifestação artistas,
acadêmicos, intelectuais e líderes políticos.
No Foro
Econômico Mundial de Davos, Milei expressou a sua cruzada contra o feminismo,
contra a diversidade sexual e associou a homossexualidade com à pedofilia. Logo
depois, anunciou uma série de iniciativas que revertem questões de gênero no
Estado e que pretendem eliminar o agravante penal no contexto de violência de
género contra mulheres, o chamado feminicídio.
"O
feminicídio legaliza que a vida da mulher vale mais do que a do homem",
apontou Milei.
Yahoo!News
"Woke"
Milei
criticou a cultura "woke" ("um vírus mental e um câncer a ser
extirpado"), o feminismo ("O feminismo radical não procura a
igualdade, mas privilégios") e concluiu, a partir de um caso, que gays são
pedófilos ("Nas suas versões mais extremas, a ideologia de gênero
constitui abuso infantil; são pedófilos").
No pacote,
entrou também a imigração e as mudanças climáticas: "Feminismo,
diversidade, inclusão, equidade, imigração, aborto, ecologismo, ideologia de
gênero, entre outros, são cabeça de uma mesma criatura cuja finalidade é
justificar o avanço do Estado através da apropriação e da distorção das causas
nobres".
Na
manifestação, a advogada Alicia Siguelboin, de 78 anos, leva um cartaz com a
figura artística de mulheres atacadas por Milei sob a inscrição "Basta
Milei".
"Queremos
frear os objetivos de Milei e que repense a sua agenda, mas tenho muita
esperança. Milei não respeita o projeto de vida do próximo. Apenas apoia uma
minoria rica: retira impostos dos carros importados de luxo, enquanto mata os
aposentados de fome", compara Alicia, quem tem advogado a favor de
aposentados.
O discurso
de ódio contra minorias e a perseguição verbal podem ter consequência no dia a
dia dos argentinos, acreditam os manifestantes.
"Com
Milei, estamos regredindo a lógicas do século XIX. A minha única esperança é
que os jovens, aqueles que mais votaram nele, repensem o voto. Espero que
deixem de apoiá-lo. Este tipo de manifestação ajuda para isso", reflete
Alicia.
Alguns
analistas acreditam que a possível queda do apoio popular pode fazer o governo
recuar em alguns objetivos como a eliminação do "feminicídio". Não
tanto por um convencimento ideológico, mas pela advertência de alguns juristas
de que a retirada desse agravante do código penal levaria centenas de
condenados a pedirem uma redução das suas penas, baseados na figura da
"lei mais benigna".
Até esta
manifestação, o projeto-lei de "Igualdade Perante a Lei" está
previsto para ser apresentado a partir de 1º de março, quando o Congresso
argentino começará o ano legislativo, inaugurado com um discurso do próprio
presidente Javier Milei, quem anunciará os objetivos para o ano de 2025.
"Vamos
eliminar o conceito do feminicídio do Código Penal Argentino porque esta
administração defende a igualdade perante a Lei, consagrada na nossa
Constituição. Nenhuma vida vale mais do que outra", confirmou o ministro
da Justiça argentino, Mariano Cúneo Libarona.
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Feminismo "radical"?
Além de
querer abolir o conceito de feminicídio, o governo quer revogar todas cotas e
leis que se enquadrarem na chamada "discriminação positiva",
incluindo paridade entre mulheres e homens no Congresso, no Poder Judiciário e
nas empresas. Também cotas para pessoas transexuais e documentos de identidade
não-binárias, aquelas que não sejam estritamente "masculino" ou
"feminino".
"O
feminismo radical é uma distorção do conceito de igualdade. Chegamos,
inclusive, ao ponto de tornar normal que, em muitos países, supostamente
civilizados, se alguém matar uma mulher, isso será feminicídio, desencadeando
uma pena mais grave do que se alguém matar um homem, devido somente ao sexo da
vítima. É a legalização, na prática, de que a vida de uma mulher vale mais do a
de um homem", criticou Milei, em Davos.
"Até
que não retiremos essa ideologia 'woke' da nossa cultura, a sociedade do
Ocidente e, até mesmo a espécie humana, não poderá retornar à direção do
progresso", concluiu Milei.
Segundo o
líder argentino, os únicos capazes de salvar o mundo são os seus aliados da
nova direita.
E, a partir
de um caso em que um casal homossexual violentou os seus filhos adotivos,
generalizou, indicando que homossexualismo é pedofilia: "A ideologia de
gênero constitui simplesmente abuso infantil. São pedófilos".
Camila Alonso Suarez-C5N
Operação Desmanche
O conceito
de feminicídio foi incorporado ao Código Penal argentino em 2012 numa votação
por unanimidade. A Lei considera como circunstância agravante, punível com
prisão perpétua (na prática, 25 anos de máxima), o homicídio "de uma
mulher perpetrado por um homem, que envolver violência de gênero".
Por outro
lado, desde 2021, os argentinos podem alterar os documentos de identidade,
optando pelo "X" em vez das opções "masculino" ou
"feminino".
No que se
refere às cotas, a Lei obriga que 50% dos legisladores nacionais sejam
mulheres, uma medida na qual a Argentina foi pioneira. Empresas e órgãos do
Estado e funcionários judiciários também têm um sistema de cotas que inclui a
contratação de pessoas transexuais.
Diferentemente
dos homicídios contra homens, os crimes contra mulheres são cometidos
principalmente por parceiros, ex-parceiros ou conhecidos, acontecendo, na sua
maioria, em ambientes privados e por questões de gênero.
O conceito
de feminicídio, teórico e político, procura tornar visível a violência contra
as mulheres, sendo adotado pela ONU em 2013, quando convocou as nações a
tomarem medidas contra homicídios de mulheres e meninas com base no gênero.
A América
Latina e o Caribe têm algumas das maiores taxas de crimes contra mulheres
motivados por ódio. Em resposta, 18 dos 33 países da região criaram uma nova
legislação que classifica o feminicídio como um crime de ódio. A lista inclui
Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador,
Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República
Dominicana, Uruguai e Venezuela.
https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/rfi/2025/02/01/milhares-de-argentinos-protestam-contra-fascismo-e-racismo-de-milei.htm
acessado em 02-02-25
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